O Mico era uma pequena e graciosa ave.
Uma ave cujo nome popular é “pássaro do amor” (Agapornis-roseicollis).
O seu nome, Mico, foi-lhe dado porque na altura existia uma personagem numa novela, que passava num dos canais, que tinha esse nome. Gostámos e assim ficou.
De cores garridas, o verde predominava sobre as restantes. Quando voava pelas divisões da casa, era admirável a plumagem azul que lhe cobria a zona das costas.
O Mico era uma presença, uma companhia, um companheiro, quantas vezes de conversas, de pequenos carinhos, aos quais respondia adequadamente, consoante o tom de brincadeira ou de maior seriedade.
O Mico alertava para qualquer som ou movimento estranho, tal era o grau de conhecimento que tinha dos costumes deste lar que o acolheu durante quase nove anos.
O Mico nunca cantava sem que o primeiro elemento da família se levantasse, não importava a hora, nem se estava sol, chuva ou frio.
O Mico tinha o seu lugar nesta casa.
Da janela da cozinha observava o que se passava na rua: os carros, as pessoas que por ali andavam, os cães, gatos e pássaros que, por vezes, o provocavam! Mas ele não se assustava, antes apreciava.
O Mico confiava em nós e isso deveria bastar-lhe para ter uma vida plena.
O Mico era uma ave livre. Entrava e saía da pequena gaiola e voava. Voava pela casa, voava para nós e, no meio desses afectos, existiram momentos de ternura, numa pequena bicada no lobo da orelha, no roçar do seu bico na nossa face, nos pequenos estalidos que mais pareciam pequenos beijos, nos exercícios que lhe fazíamos e a que chamávamos “escadinhas”.
O Mico dormia a sesta. Todos os dias, a meio da tarde, o seu cantar era diferente, contínuo e quase inaudível, como que a embalar-se para um sono leve.
À hora das refeições lá cantava de uma forma diferente, mas familiar, a pedir que lhe servissem mais uns grãos de sementes para nos acompanhar. Sim, porque o Mico passou a sua vida nesta casa, na janela da cozinha que era, também, o seu território.
À noite, depois do jantar, juntava-se a nós na sala e lá ficava enquanto a televisão emitia sons e cores que lhe despertavam a atenção.
Por vezes, no ombro ou na cabeça de um de nós, acompanhava o nosso trabalho no computador e o que ele gostava de andar na parte de cima do monitor, espreitando para o mesmo! Mas ninguém o podia retirar do meu filho mais velho. Entendiam-se tão bem que qualquer descrição se torna insuficiente.
Depois, não muito tarde, lá ia para a sua casa e ali dormia, até que um novo dia começasse.
Hoje, o Mico acordou, ou mal acordou, mas não viria a terminar mais um dia na sua vida.
O Mico deixou-nos, e deixou um vazio enorme nesta casa.
O Mico, o meu amigo, o nosso amigo, faleceu na palma da minha mão, abrindo os olhos pela última vez, partindo para uma outra dimensão.
Faz falta o seu cantar, a sua forma de comunicar, aquele espaço agora vazio que era o dele.
Fazem falta as suas reclamações, o seu olhar característico quando olhava por detrás do bebedouro.
O teu lugar jamais será ocupado por um outro, porque mesmo que assim fosse, nunca seria o “Mico”.
Estejas onde estiveres, estarás, com toda a certeza junto de tantas outras aves a encantar com os teus encantos naturais. Os encantos de uma pequena ave que se despediu ontem de nós.
Voa Mico…