Simples atletas do G.D “Os Nazarenos” mal sabíamos no que nos iríamos meter quando fomos ao Campeonato Nacional de Corta-Mato que naquele ano [finais da década de 70] decorria em Espinho.
Espinho era – por assim dizer – no “cu de Judas” para os pikenes da Praia.
Mas lá fomos.
No “pouca-terra”, horas e horas, intermináveis, até chegar a Espinho.
Ficámos hospedados numa pensão de rés-do-chão e na manhã seguinte, alguns de nós, fomos a pé até ao aeródromo de Espinho, local onde iriam decorrer os campeonatos.
Chegados ao local, que ficava a uns 3 kms, já cansados, nem tivemos tempo de aquecer.
Diz-nos o nosso director – cujo nome me abstenho de dizer – “vamos lá, toca a correr”!!!
Aquilo foi, mais ou menos, assim.
Equipámo-nos à pressa e começámos a correr, passada a passada, volta após volta.
O meu colega do lado sempre a puxar por mim e eu por ele, espírito de companheirismo.
Nos momentos maus dos “uns” devem existir os “outros” para puxar pelos “uns”.
Naturalmente que o resultado não poderia ter sido o desejado, mesmo que não tenhamos fechado o pelotão – garra de Nazarenos.
Bom. Acabada a corrida lá voltámos a pé até à estação de comboios que nos haveria de trazer até à Praia, melhor dizendo à estação de Valado dos Frades.
Horas infindáveis de comboio até que chegámos à estação de Valado dos Frades por volta da uma da manhã!!!
Se a viagem foi complicada, longa de doer com o pessoal a dormir de tanto cansaço e pouco apoio, o pior estava por vir.
(De recordar que alguns de nós tinham 14/15 anos.)
Não havia um transporte do nosso grupo desportivo – cujo equipamento vestíamos garbosamente em todas as provas oficiais que disputávamos – à nossa espera. Nem sinal, nada de nada. Uma ausência inexplicável.
Naquela altura não existiam muitos telemóveis, nem os pais tinham dois ou três veículos para acudir aos seus filhos.
Na verdade, automóveis era coisa rara na Nazaré de finais da década de setenta.
Lá viemos, tínhamos de chegar a casa, qualquer que fosse o custo.
A noite estava escura mas no meio do Valado não se notava graças aos candeeiros.
O problema foi quando chegámos à recta da “Casinha Velha”.
Não se via nada.
Noite escura e nem um candeeiro para animar o pessoal. Os tais atletas do G.D. “Os Nazarenos”, aqueles – plural – que tinham ido representar o nosso grupo no Campeonato Nacional de Corta-Mato.
Parámos e colocámos nas meias os bens que achámos por bem guardar: relógios (quem os tinha), fios (quem os tinha), etc., e tal.
Lá fomos caminhando e poucos metros antes da “Casinha Velha” uma luz vermelha, forte e deambulante, aparece por cima do monte em frente.
Estacámos!
Assustados, fugimos para os lados da estrada perguntando o que seria aquilo.
Um dos colegas caiu numa ravina junto a um pequeno aqueduto em frente ao antigo Moinho do Abegão!!
Sem respostas, a luz vermelha que deambulava entre o nascente e o poente parou por alguns segundos e depois numa reviravolta seguiu – lembro-me bem – no sentido nascente.
Corajosos como éramos – era preciso coragem para fazer atletismo naqueles tempos, chegavam a chamar-nos “cambada de malandros” e outras coisas que nem vale a pena mencionar aqui – lá fomos caminhando, passo a passo, medo a medo, olhando uns para os outros.
Passámos o S. Brás e o coração batia forte, sempre em passo acelerado e, ao mesmo tempo, temido, até que descemos a Pederneira, antes de descermos as escadas que dão para o largo onde hoje se encontra o tribunal.
Ao longe ouvimos vozes femininas.
Eram as nossas mães a “ralhar” com o Sr. Director.
Junto à “Ribatejana” – que era uma garagem da empresa de transportes com o mesmo nome – encontrámos o conforto dos braços de quem, na realidade, se preocupa connosco, as nossas mães e alguns pais também.
É bom lembrar que nesses tempos a Nazaré era uma terra de pescadores e “embarcadiços” e que cabia às mães a gestão da casa – a tão falada sociedade matriarcal ou matrifocal, como muitos antropólogos já estudaram.
No fim da epopeia cada um regressou a sua casa e semanas depois na saudosa papelaria “Vagui” vim a perceber do interesse pela história.
Foi um amigo que redigiu essa notícia, da qual não guardei qualquer exemplar, mas que, ainda hoje, é abordada, aqui e acolá, por amigos, mas sempre em jeito de uma risada saudável.
É o que acontece às más experiências quando acabam em bem.
Quanto ao meu – bem como de outros colegas – percurso na minha equipa do coração, o G.D. “Os Nazarenos”, não haveria de sobrar muito tempo até terminar, também com uma história muito complicada. Mas isso é assunto que contarei num outro momento.
Que fique bem claro que o Grupo Desportivo “Os Nazarenos” está no meu coração, mas alguns “mandantes” nem por isso.
Esta é a verdadeira história. No entanto, e como sou uma pessoa acrítica, fica em aberto qualquer vontade de comentar e/ou desmentir o que aqui se escreveu, na primeira pessoa.