[…] Como já foi referido nos séculos XIV e XV a lagoa sofria um processo de assoreamento que vinha já de longe e que chegava a obstruir completamente a sua barra, cortando-lhe a comunicação com o mar. Os maiores assoreamentos desta época, de que restam notícias concretas, foram os de 1377, ano em que, no entanto, a lagoa não chegou a fechar-se por completo e o de 1455.[1]
Não será por acaso que nas visitações efectuadas em 1432 e 1434 à Igreja de Santa Maria da Pederneira, se refere que a visitação a esta freguesia permite algumas conclusões muito importantes para a história local: deixa ver a existência de duas igrejas, uma de Santa Maria, agora considerada da vila e que é alvo da visita, e outra, antiga, de S. Pedro, agora apenas local de alguns actos litúrgicos muito reduzidos e específicos. É uma situação que tanto pode corresponder a um crescimento da povoação, aliás confirmado por outras fontes, como pode estar ligada a uma mudança do centro de actividades da população: a igreja teria acompanhado esse movimento da população, na sua implantação num outro local.[2]
Parece-nos que a população da Pederneira continuava muito arreigada à sua Igreja de São Pedro. Facto que pode ser comprovado pela continuidade na sua utilização.
A nova igreja da Santa Maria, ao que parece, deveria estar implantada num novo local, afastada da antiga igreja de São Pedro e com uma condicionante, não possuía adro o que, perante a população local terá tido influência na recusa em aceitar aquele novo templo como “seu” e deixarem os seus “mortos” no adro da igreja de São Pedro.
A nova igreja não tinha adro para sepultar os finados e por essa razão prática (e forte) e por tradição, a população sentia-se bastante ligada à de S. Pedro. Aí enterravam os seus mortos e aí tinha lugar a bênção dos Ramos. A procissão desse dia percorria o caminho que a ligava à igreja da vila.[3]
O percurso entre a Igreja de São Pedro à Igreja da vila, que se supõe ser a nova igreja de Santa Maria da Pederneira, indicia uma distância, mas não fornece mais informação sobre a sua localização, sublinhando, no entanto, um afastamento do local primitivo, que se continua a desconhecer.
Conforme já foi referido, uma das razões aventadas para a construção de uma nova igreja na Pederneira terá sido a sua falta de capacidade física para “atender a todos os fregueses”, sendo, hipoteticamente, pequena e logo insuficiente para o culto.
Ainda assim a igreja de Santa Maria talvez fosse algo recente (não obstante os visitadores mandarem pôr o seu campanário direito, pois, como estava, não era seguro) ou a sua existência não implicaria um corte com a antiga.[4]
Naturalmente, que se estranha o facto de uma igreja “nova” não possuir adro, assim como ter o seu campanário a necessitar de reparações.
Leva-se em conta que esta igreja deverá ter sido erigida já na centúria de Trezentos, e que o estado do seu campanário poderá estar ligado ou à sua deficiente construção ou a algum acontecimento de cariz natural que o tenha danificado. Não se encontra, perante os dados disponíveis, outra razão para tal.
Já quanto à inexistência de adro, poderão ter existido muitas razões para não ter sido construído, entre elas a manutenção do local de enterramento no velho adro de São Pedro.
Neste sentido, restaria à igreja de São Pedro o único papel de uma necrópole medieval e à de Santa Maria da Pederneira um papel transitório no percurso geográfico, social e eclesiástico que os habitantes da Pederneira estavam a iniciar. […]
In FIDALGO, Carlos. As Igrejas da Pederneira: do séc. XII ao séc. XVII. Uma análise, Caldas Editora, 2012, p.46-47.
[1]Ibidem, p. 274.
[2]Considera-se mais plausível a segunda hipótese.
[3]MARQUES, Maria Alegria – Estudos sobre a Ordem de Cister em Portugal, p. 211.
[4]Ibidem, p. 211.